Mães são animais estranhos que sempre te fazem sentir mal demais ou bem demais por algum motivo.
Minha mãe me apunhalou pelas costas.
Depois de uma semana fofa, forte, feliz, cheia de bons momentos, de coisas boas pra lembrar, de música, de arte, de amigos, de balões e confete, minha mãe me apunhalou bem no meio das costas. Ela teve um infarto, e ousou me culpar por estar de cama, dormindo, com 39.5 de febre, sem conseguir me levantar, depois de uma semana de evento.
Eu me senti culpada sozinha, sem precisar dela com o dedo apontado na minha cara, sem precisar dos gritos, e de todas as pessoas rindo de mim, e da sensação de que eu sou a pior pessoa do mundo.
Eu pensei, sim, que eu podia ter acordado e descoberto que minha mãe morreu. Eu pensei, sim, que eu podia nunca mais vê-la. Eu tive medo sozinha, sem que ela tentasse me mostrar o que ela imagina que eu não pude perceber.
Eu não estava lá pra cuidar dela, ela não estava lá pra cuidar de mim. E aí? Vamos eternamente culpar uma a outra? Não, porque eu não estou culpando ela, embora ela continue insistindo que é culpa minha. Eu só estou de cabeça baixa, ouvindo e aceitando, e me sentindo cada vez pior. De novo, e de novo.
Eu podia muito bem enfiar na minha cabeça que eu não tenho culpa, porque não tenho mesmo, e simplesmente deixar todas as conversas e reclamações dela no mute. Mas o peso daqueles olhos, e o tom de voz dela, me dizendo que eu não ligava pra ninguém... É esse tipo de pessoa que ela pensa que eu sou? Que não liga, que não se importa? Ela acha mesmo que se eu conseguisse, eu não teria ido lá e feito alguma coisa?
Mas ela nunca vai ouvir uma palavra sequer do que eu estou dizendo, e nunca vai saber como é se sentir assim. Porque quando se trata de mim, ela nunca vê ou ouve nada, nunca entende nada realmente, nunca abre os olhos ou os ouvidos pra nada.
Família é mesmo pra essas coisas. Machucar você, magoar seus sentimentos. Te fazer sentir mal. É pra você saber onde não errar quando quiser uma família só sua. É pra você saber o quanto é insignificante na vida das pessoas.
É difícil entender, eu acho. É difícil explicar também. É difícil continuar sentindo tudo isso. Mata por dentro...
Mas eu não quero que ela morra. Não quero que ela vá embora sem me dizer adeus. Não quero que ela desapareça. Só machuca tanto porque, apesar de tudo, essa a minha mãe. A mãe que eu amo. A mãe que eu queria que me amasse de volta.
E é por isso que, agora, eu queria tanto ir embora. Pra muito, muito longe. Pra onde a dor não pudesse me afetar. Pra onde eu não precisasse explicar pra minha própria mãe como eu estive doente e sozinha durante toda a manhã, como eu chorei quando eu chamei e ninguém me respondeu, onde eu pudesse esquecer o dia de hoje e só pensar em coisas boas, caminhar com os pés descalços na areia ou voar por entre as nuvens ou qualquer coisa que me ajudasse a não pensar.
Eu queria ir pra um lugar onde minha mãe não dissesse nunca mais "o que as pessoas devem pensar" ou "todo mundo acha" ou coisas assim. Onde ela se preocupasse comigo, com o que eu penso, com o que eu sinto, onde ela me contasse que está doente, que se sente mal, me pedisse ajuda, me considerasse alguém importante.
Eu só queria que ela, somente ela, me reconhecesse. Pelo menos uma vez.
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